São 23h41 agora. Vamos ver até que horas eu termino isso.
Eu nem sei por onde começar. Só sei que, aos poucos, tenho me sentido menos e menos como eu -- e mais como uma espectadora de mim mesma. Como se eu olhasse para uma pessoa que se parece comigo, mas não sou eu.
Me olho no espelho e me pergunto: será que eu sempre fui assim e nunca percebi? Ou será que estou mudando?
Não sei mais distinguir o que é estar sóbria, o que é estar com pressão baixa... só sei que parece que vivo num transe há dias, e esses dias simplesmente não passam. Eu tomo meu remédio, passeio com Lelê, bebo água, vou às aulas, me alimento.
Mas parei de fazer atividade física. Praticamente não converso com outras pessoas. Passo a maior parte do meu dia em frente a uma tela, esperando alguém falar comigo -- e, no fundo, o que eu queria mesmo era que fosse ele.
Tenho certeza absoluta de que você vê minhas mensagens e, deliberadamente, demora para responder. Que sabe que eu estou sempre disponível, e se acomoda nisso, me tratando como apenas mais uma coisa no seu dia. Bizarro pensar que estamos jogando joguinhos a essa altura do campeonato!
Mas será que eu tenho mesmo essa certeza absoluta? Como eu posso ter certeza? Antes você não era assim (ou era?). Será que nunca foi diferente -- será que o que mudou fui eu?
Será que antes eu não era obsessiva... e agora sou?
É isso que passa na minha cabeça. Como se eu não soubesse mais o que é real e o que é invenção. Como se eu precisasse que alguém validasse meus pensamentos, porque sozinha eu já não consigo distinguir o que é “normal” do que é “demais”.
Por exemplo: eu nunca tinha notado que estava obcecada por você.
Essa semana eu percebi -- acho que estava mesmo. E todas as minhas amigas disseram: “é óbvio!”
Como eu nunca vi isso? Eu achava que só estava amando muito.
Não é normal falar todos os dias por videochamada? Por várias horas? Às vezes o dia inteiro?
Eu poderia fazer isso todos os dias por meses e não acho que me cansaria.
E só de escrever isso, percebo que é claro que eu estava obcecada.
Mas como é que eu não via isso antes? Eu não me sentia obsessiva.
Eu jurava que estava pulando de cabeça, de mãos dadas com alguém -- e só depois descobri que você não pulou comigo. Ficou na borda, me vendo chafurdar na água, e depois disse que não ia pular.
E eu só consigo pensar: “mas eu tinha certeza de que você ia pular comigo... não?”
Isso não deveria ser pra sempre? To be madly in love?
Por mim, eu tinha certeza de que poderia viver o resto da vida me sentindo assim. De fato, eu não estava pensando muito à frente -- e por que deveria?
Escrever tudo isso me faz perceber o quanto eu estava envolvida. Apaixonada. Endorfinada. Feliz. Amada. Vivendo o turbilhão mais delicioso de hormônios e sinapses que…
[PAUSA -- ELE ME LIGOU]
É 1h46 agora. Acho que estou me sentindo melhor. Vamos ver como eu acordo mais tarde.
De qualquer forma... nem acredito que consegui segurar todos esses pensamentos intrusivos enquanto falava com ele -- sem dizer nada além de: “você ainda me ama, né?”
Medo genuíno de estar ficando maluca.